sexta-feira, março 30, 2012

FUGA


Eu vi a lua fugindo
pro alto da madrugada
estava só
a coitada.
 
Cadê seu manto de estrelas?
Cadê seus raios brilhantes?
Cadê as nuvens fagueiras
brincando de esconde esconde?

E tive tanta piedade
que passei a noite inteira
a acompanhar seus passos

até que enfim se deitasse
ou espalhasse a beleza
do outro lado do mundo
onde não posso mais vê-la.

Eu vi a lua fugindo
sumindo
se indo embora
suas lágrimas caindo
escorrendo céu afora

e me perdi na tristeza

[elza fraga]

segunda-feira, março 26, 2012

NAUFRAGADA



As vezes me sei a deriva

perdida
como um pequenino barco
batendo
... com o seu costado
no mar encapelado

salto ondas gigantes
equilibro na calmaria
que dura um só segundo

e no meio da imensidão
profunda
me agarro ao mastro

e acabo dando com os cascos
no fim do mundo

praia esquecida
sem pássaros, sem nada

só sobrevida!

[elza fraga]

PREPARAÇÃO



Minha janela

é meu desafio
por ela puxo o fio
onde teço
a rede
de estrelas cadentes

pra descansar
ardente
o impossível

quando chegar o dia
do vazio.

[elza fraga]

REDEMOINHO




Rodopiou a nuvem,

espiralando
em desenhos doidos
transparentes
 
igualzinho
a vida da gente!

[elza fraga]

ACOMODAÇÃO



Pedi asas

me deram pés no chão

Pedi liberdade
me deram coração

Pedi leveza
me deram sentimentos

Perdi os argumentos
sem apelação
ou liminar

Restou acomodar
até o fim dos tempos

[elza fraga]

TRIBUTO AO SOL



Como o girassol

vivo a girar
buscando o sol
 
dançante ilusão
que me alucina

Até queimar
a retina

dor e paixão
Luz e ruína
onde reclina

o fogo sagrado
que ilumina
indomado

todo o passado
morto

não enterrado.

[elza fraga]

ASSOMBRAMENTO



Havia um certo ar

de não me toques

Um certo toque de impertinência

na sua presença

ali tão ausente
parada
bem na minha frente

e eu sabia
que se estendesse a mão
atravessaria
seu coração
sua pele
como se fosse
fluido

eu poderia, eu só,
transformar
num sopro
tudo em pó
caído

mas me contive
e deixei que caminhasse
calado
morto vivo
largando seus pedaços

até o infinito

e fiquei aqui
comigo
prensando a ferida

que me sobrou
de vida.

[elza fraga]

O QUANTO É LONGA A NOITE




Sol doente
cai poente
nem avermelhou
Estranhamente
nenhuma estrela
estreou a noite
acendendo
a imensidão

Medo de foice
ceifando almas
na calma
da escuridão
impiedosamente
me engole a alma

pra sempre

[elza fraga]

MUDANÇA DE ESTAÇÃO



Fora da minha janela
queima como estação
o mais ardente verão

Mas dentro do meu coração
e do meu sonho

sei que serei
sempre

outono.

[elza fraga]

ENTERRO


[Fonte da imagem: noticias.terra.com.br]

Era um casebre
de cor bem alegre
no nariz da serra

vem a terra
rolando ladeira
enterra
uma prole inteira

Sobrou pendurada
a varanda
a zombar
do nada

E um passarinho
que saiu do ninho
para espiar

e cantar seu canto
para embalar
o pranto

enquanto
a terra aterra.

[elza fraga]

RETRATO HUMANO



Escuta bem
e não esqueça nunca
todos te querem
e ficam ao teu lado
quando não precisas
do amparo
estás ladeira acima

mas somem
na primeira esquina
assim que a vida
te empurra
ladeira abaixo.

[elza fraga]

SEM ARREPENDIMENTO




Sabia
que o tempo passa
sabia
que a vida é curta
sabia
que as dores chegam
junto com as folhas caídas
muito antes de parida

Assim mesmo eu quis a vida!

[Elza Fraga]

PORTO SEGURO




Rezo durante o dia
[e tanto]
pra noite logo chegar
pra poder fugir da vida

e me refugiar
no sono
porque é lá
que dormem

todos
os sonhos

que eu tento acordar.

[elza fraga]

DERRADEIRO ABRIGO





Tem gente
de alma dura
não se amolda
ao corpo que a carrega
o arrasta como armadura
como quem leva fardo
de agrura.

Se deixam morrer
lá no passado

todos os dias
enterram o desespero

apenas pressentem
o presente
e levam flores
a própria sepultura.

Andam pela vida
sem viver
em murmurios infinitos

guardam só rancores
gostam das dores
e as espalham ao vento

sem notar que a liberdade
está nas próprias mãos
e é tão fácil
sair desta prisão
é só reconhecer
em Cristo
o verdadeiro amigo
o amparo

o único abrigo.

[elza fraga]
...

POR UM FIO




A minha casa
sou eu
me equilibro
solitária

dentro dela

presa entre
o que sobrou
cantarolo a capela
o que a vida me ensinou
com cascudos
e mazelas

[elza fraga]

IMPOTÊNCIA


Quando partir
quero sair
pela porta mágica
estreita,
... um ser
quase invisível

olhar no chão
me esgueirando
pelos vãos

envergonhada
de ter visto
tanta maldade
e mesmo
apesar da piedade
nada
poder fazer

pra conter
os absurdos cometidos
por alguns 'humanos'
contra seus irmãos
de outras raças

Permita-me,
Senhor,
a água da alma
saltando do olho

Permita-me,
Senhor,
a cabeça baixa

[elza fraga]

Ofereço este poema a amiga Lúcia Constantino, pela sua luta incessante para salvar nossos amigos animais contra a maldade de alguns irmãozinhos humanos que ainda se encontram no começo da estrada que leva a Luz!

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